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Lei do CARF: voto de qualidade e outras alterações (Lei 14.689)

A Lei nº 14.689/2023, conhecida como Nova Lei do CARF, introduziu uma série de modificações nos processos administrativos fiscais, com foco particular nos julgamentos realizados pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais.

A principal modificação está no retorno do voto de qualidade. Contudo, além desse ponto, a legislação também engloba outras mudanças significativas que afetam diversos aspectos dos procedimentos do CARF.

Neste artigo, iremos explorar as principais alterações decorrentes do retorno do voto de qualidade, além de examinar os demais impactos trazidos por essa nova legislação.

Continue a leitura para compreender a profundidade das modificações e os potenciais impactos que elas podem exercer no cenário dos processos administrativos fiscais.

O que é a Lei do CARF (Lei 14.689)?

No dia 21 de setembro de 2023, entrou em vigor a Lei nº 14.689/23. O texto trouxe mudanças importantes no campo dos litígios administrativos fiscais, principalmente em relação às decisões proferidas pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF). Um dos principais aspectos da nova lei é a reintrodução do voto de qualidade.

Outro ponto interessante sobre a Nova Lei do CARF é que a legislação teve origem no Projeto de Lei nº 2.384/2023 que, por sua vez, passou por um longo e minucioso processo de análise e discussão. Aliás, algumas partes do texto original sofreram o veto do Presidente da República, o que limitou alterações bastante esperadas, com um olhar especialmente direcionado para as dinâmicas de julgamento dentro do CARF – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais.

Foram vetados, por contrariedade ao interesse público e inconstitucionalidade, 15 temas que até então integravam o projeto de lei. Parte deles previa a redução ou o perdão de dívidas devidas por contribuintes e cobradas pela Receita Federal. 

Quais as principais mudanças com a Lei do CARF?

A Lei do CARF trouxe diversas mudanças, cada uma delas com as suas particularidades. Confira em detalhes adiante.

Voto de qualidade

Vinculado ao Ministério da Economia, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais atua como um tribunal administrativo, resolvendo os impasses entre os contribuintes e a Receita Federal. Até 2020, quando as decisões chegavam a um impasse, o voto do presidente da câmara de julgamento, geralmente um representante da Fazenda, era o que prevalecia.

Tudo mudou com a Lei 13.988, de 2020. Essa legislação eliminou a prevalência do voto do presidente da câmara, chamado de voto de qualidade, dando a vantagem ao contribuinte em caso de empate nas decisões.

A entrada em vigor da Lei nº 14.689/23 traz de volta o voto de qualidade, restabelecendo a prerrogativa do presidente da sessão de emitir um voto decisivo em caso de empate, concedendo-lhe o poder final para determinar o desfecho do julgamento. Ou seja, houve a restauração da regra anterior em caso de empate de julgamento no processo administrativo.

Vale lembrar que, sendo o órgão julgador composto por oito conselheiros, quatro indicados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil e outros quatro indicados pelas confederações das empresas, os casos de empate são bastante comuns.

Garantia em processo judiciais

A nova Lei do CARF também instituiu a dispensa da apresentação de garantia para a discussão judicial dos créditos resolvidos favoravelmente à União pelo voto de qualidade, conforme dispõe em seu Art. 4º:

Aos contribuintes com capacidade de pagamento, fica dispensada a apresentação de garantia para a discussão judicial dos créditos resolvidos favoravelmente à Fazenda Pública pelo voto de qualidade (…).

Ainda sobre esse tema, vale ressaltar que o Congresso Nacional derrubou o veto presidencial em relação ao dispositivo que previa a possibilidade de a União executar fiança e seguro garantia antes do trânsito em julgado da discussão de mérito, ou seja, antes da decisão final do processo. Assim, permanece o disposto no §3º do Art. 4º da referida lei:

§ 3º Nos casos em que seja exigível a apresentação de garantia para a discussão judicial de créditos resolvidos favoravelmente à Fazenda Pública pelo voto de qualidade (..), não será admitida a execução da garantia até o trânsito em julgado da medida judicial, ressalvados os casos de alienação antecipada previstos na legislação.

Aplicação de multas

A Lei nº 14.689/2023, a nova Lei do CARF, estabeleceu a exclusão das multas nas situações em que houver a aplicação do voto de qualidade.  Ou seja, caso o julgamento do processo seja resolvido favoravelmente à Fazenda pelo voto de qualidade, há expressa determinação para exclusão das multas. É o que estabelece o §9-A do Art. 2º da norma:

§ 9º-A. Ficam excluídas as multas e cancelada a representação fiscal para os fins penais de que trata o art. 83 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, na hipótese de julgamento de processo administrativo fiscal resolvido favoravelmente à Fazenda Pública pelo voto de qualidade previsto no § 9º deste artigo.

Medidas de incentivo à conformidade tributária

O Palácio do Planalto vetou uma série de artigos que criavam “medidas de incentivo à conformidade tributária”. Entre elas:

  • Redução, em pelo menos 1/3, do valor das multas de ofício aplicadas pela Receita;
  • Redução das multas de mora em pelo menos 50%.

Outro dispositivo vetado reduzia em 1/3 o valor de multas de ofício nos casos de:

  • Erro escusável do contribuinte que demonstre intenção de cumprir a obrigação tributária;
  • Divergência na interpretação da legislação;
  • Práticas reiteradas adotadas pela administração ou pelo segmento de mercado em que o contribuinte estiver inserido.

Transações tributárias

Em relação às transações tributárias, o Art. 10 da Nova Lei do CARF dispõe da seguinte forma:

Art. 10 – A transação na cobrança da dívida ativa da União, das autarquias e das fundações públicas federais poderá ser proposta pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, pela Procuradoria-Geral Federal e pela Procuradoria-Geral do Banco Central, de forma individual ou por adesão, ou por iniciativa do devedor, ou pela Procuradoria-Geral da União, em relação aos créditos sob sua responsabilidade. 

No termos do § 2º do Art. 17, as propostas de transação por adesão serão limitadas ao desconto de 65% do crédito tributário, com o prazo máximo para quitação em 120 meses.

Caso o contribuinte seja pessoa física, microempresa ou empresa de pequeno porte, o § 4º estipula que a redução máxima pode chegar a até 70%, com prazo de quitação de até 145 meses.

Por fim, o §3º do Art. 19 dispõe que a transação por adesão poderá prever a abrangência de todos os litígios relacionados à tese objeto da transação, ainda que não estejam definitivamente julgados.

Lei do CARF: quais foram os dispositivos com vetos presidenciais?

O presidente em exercício, Geraldo Alckmin, sancionou com vetos a Lei 14.689/2023. Dessa forma, a publicação da norma no Diário Oficial da União ocorreu em 21 de setembro de 2023, contendo entre os principais dispositivos vetados:

  • Redução da multa de ofício de 75% para 25% nos casos de erro escusável; e fim da multa agravada que impedia que a multa de 150% fosse majorada para 225%;

  • Possibilidade de o contribuinte obter perdão da dívida, de acordo com o histórico de conformidade;

  • Possibilidade de oferecer seguro fiança e fiança bancária para garantia apenas do valor principal atualizado do débito, com os mesmos efeitos da penhora do valor integral da execução, em casos de discussão judicial;

  • Caso vencida no processo, custo das garantias fica a cargo da Fazenda Pública, devendo esta realizar o pagamento integral, devidamente atualizado;

  • Criação da Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Pública Federal para tratar de controvérsias jurídicas entre a autoridade fiscal ou aduaneira e o órgão regulador. 

Lei do CARF: quais foram os vetos presidenciais derrubados pelo Congresso?

Por sua vez, o Congresso Nacional derrubou em 14 de dezembro alguns dos vetos presidenciais a trechos da Lei 14.689/2023. A íntegra pode ser acessada no Veto nº 27/2023. Veja aqui as principais implicações dos trechos derrubados:

  • Com o veto, as garantias apresentadas pelos devedores só poderão ser liquidadas após o trânsito em julgado da ação que discute a dívida. Também fica estabelecido que essas garantias seriam limitadas ao valor principal do débito;

  • Restabelecimento do dispositivo que determina o cancelamento de ofício de multas excedentes a 100%, mesmo que estejam em programas de refinanciamento. Caso parte ou todo o valor já tenha sido pago, o contribuinte deve entrar na Justiça, que determinará o valor a ser ressarcido. O pagamento pode ser feito em precatório ou por compensação com outros tributos;

  • Outro dispositivo que foi retomado possibilita ao contribuinte negociar acordo com a União relativos a dívidas oriundas de decisões pelo voto de qualidade.

Qual o impacto para contribuintes com as mudanças trazidas com a Lei do CARF?

A recente lei apresentou uma mudança fundamental: em situações de empate decidido pelo voto de qualidade, o contribuinte agora tem o direito de ser isento da multa e evitar qualquer processo penal fiscal. 

Adicionalmente, é possível ao contribuinte escolher realizar o pagamento do montante principal em 12 parcelas, mediante uma declaração de concordância em não contestar a decisão do CARF judicialmente.

Dúvidas frequentes sobre a Lei do CARF

Confira a seguir questionamentos frequentes sobre a Lei do CARF para entender ainda mais sobre o tema.

Como funciona o voto de qualidade?

No Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, o voto de qualidade é uma prerrogativa do presidente da sessão de julgamento. Quando há um empate no placar das votações, ou seja, um número igual de votos favoráveis e contrários, o presidente tem o poder de desempatar a situação.

Esse voto de desempate é conhecido como voto de qualidade e é decisivo para determinar o resultado final do julgamento. No CARF, o presidente normalmente é um representante da Fazenda, e seu voto de qualidade muitas vezes reflete o posicionamento do órgão fiscal em questões tributárias.

Anteriormente à Lei 13.988/2020, o voto de qualidade beneficiava a Fazenda, já que, em caso de empate, o voto do presidente favorecia a posição do Fisco. Com a Lei 13.988/2020, houve extinção do voto de qualidade, oferecendo vantagem aos contribuintes em situações de empate.

No entanto, a Lei nº 14.689/23 restaurou o voto de qualidade, retornando à situação anterior à Lei 13.988/2020. Assim, em caso de empate, o presidente do CARF retoma a prerrogativa de decidir o desfecho do julgamento por meio do voto de qualidade.

Quem faz parte do CARF?

O CARF opera como um corpo colegiado equitativo, composto por Conselheiros provenientes tanto da Fazenda Nacional quanto dos Contribuintes. 

Os representantes dos Contribuintes têm a nomeação das Confederações Econômicas de âmbito nacional. Dessa forma, para se tornarem Conselheiros, os candidatos passam por um processo de indicação por meio de uma lista tríplice, sendo requerido conhecimento sólido e experiência específica em direito tributário, tributos federais e aduaneiros. 

O Comitê de Seleção de Conselheiros realiza a seleção dos candidatos, sendo a indicação posteriormente endossada pelo Ministro da Fazenda para a assunção do cargo.

Em sua totalidade, o CARF abriga 90 conselheiros, entre titulares e suplentes, divididos em três seções. Segundo informações do Ministério da Fazenda, o volume de disputas levadas a este conselho é significativo. Apenas em 2023, mais de 400 mil processos abertos, o que representa um valor financeiro próximo a R$ 4,5 trilhões.

Quem sancionou o voto de qualidade no CARF?

O presidente da República em exercício, o vice-presidente Geraldo Alckmin, sancionou com vetos a lei que retoma o chamado voto de qualidade no CARF. A sanção ganhou publicação no Diário Oficial da União (DOU).

Conclusão: o que vimos sobre a Nova Lei do CARF?

A Lei nº 14.689/2023, conhecida como Nova Lei do CARF, representa uma reformulação significativa nos processos administrativos fiscais, especialmente nos julgamentos conduzidos pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Sua implementação trouxe uma série de mudanças, sendo o retorno do voto de qualidade o ponto central.

A reintrodução do voto de qualidade revogou o benefício anteriormente conferido aos contribuintes pela Lei 13.988/2020, favorecendo-os em situações de empate. Com a Lei 14.689/2023, entretanto, houve uma restauração da regra anterior, conferindo ao representante da Fazenda o poder decisivo em casos de impasse.

Além disso, a nova legislação trouxe ainda outras alterações relevantes, incluindo a impossibilidade de execução da garantia até o trânsito em julgado da medida judicial, ressalvados os casos de alienação antecipada previstos na legislação.

Importante ressaltar que a sanção da Lei do CARF contou com vetos desfavoráveis aos contribuintes. Ademais, recentemente, em dezembro de 2023, o Congresso derrubou alguns dos vetos presidenciais. Portanto, espera-se novas repercussões acerca das novas regras, bem como entendimentos que devem surgir a partir da regulamentação dos dispositivos.

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