Muitos países, como é o caso da Inglaterra e Alemanha, vem passando por reformas quando o assunto envolve contratos de seguro. Com a nova lei de seguro, a Lei 15.040/24 (também denominada Marco Legal dos Seguros), tem-se algumas novidades no setor de seguros no Brasil.
Vale dizer que, no processo de construção do Projeto de Lei que deu origem a essa lei, o PL 2597/2024, houve a participação de diversos setores do ramo. Entre eles: Confederação Nacional de Seguros, Federação Nacional dos Corretores de Seguros, Instituto Brasileiro de Direito do Seguro, Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor e Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.
Ou seja, aconteceu uma discussão profunda e abrangente com diversos setores atrelados ao ramo de seguros.
Como ficará claro ao longo do conteúdo, a nova lei de seguro consegue tornar os processos relacionados a seguros no país mais transparentes. Isso, em termos mais simples, aumenta a proteção para os consumidores, tanto pessoas quanto empresas.
Para tratar o tema com mais detalhes, continue lendo.
O que é a nova lei de seguro?
Também chamada de Lei dos Contratos de Seguro ou, ainda, Marco Legal dos Seguros, a nova lei de seguros — a Lei 15.040/24 — originou-se do Projeto de Lei 2597/2024.
Este PL foi sancionado pelo Presidente da República no dia 9 de dezembro de 2024 e, assim, convertido na Lei 15.040/24, cuja publicação foi feita no Diário Oficial da União já no dia seguinte, 10 de dezembro.
Essa nova lei, no entanto, só entrará em vigor “após decorrido 1 (um) ano de sua publicação oficial”, como está expressamente descrito no art. 134 da própria Lei 15.040/24.
Em resumo, com essa nova regulamentação, o Brasil vai usar um modelo que combina uma Lei de Contrato de Seguro com a atuação de uma autoridade reguladora, a Susep.
Isso, como falamos logo no começo, coloca o país em linha com as reformas recentes de outros países que, ao reformularem suas leis referentes a contratos de seguro, experimentaram um crescimento econômico no setor securitário.
Para que serve a nova lei de seguro?
A nova lei de seguro tem algumas finalidades específicas, sendo uma delas a de tornar a relação entre as seguradoras e os consumidores mais equilibrada e, assim, evitar abusos.
Ela também visa “gerar confiança nas contratações”, como destacado pela Superintendência de Seguros Privados, o que se dá por meio de dispositivos que tratam sobre os aspectos éticos em contratos de seguro, trazendo mais clareza na regulação de sinistro e no agravamento de risco, por exemplo.
Esses, claro, são só alguns dos porquês para o Marco Legal dos Seguros existir. Há outros:
- Aumentar a demanda no mercado de seguros brasileiro, favorecendo o aspecto econômico;
- Fomentar o crescimento desse mercado de forma saudável.
O próprio autor do PL que originou essa nova lei de seguros, o deputado José Eduardo Cardozo, diz que a finalidade dessa nova regulamentação é beneficiar tanto o setor de seguros quanto o de economia e a sociedade.
Afinal de contas, a meta do mercado de seguros brasileiro é elevar sua participação para 10% do PIB até o ano de 2030. Assim, o Marco Legal dos Seguros, ao aumentar o acesso a seguros para o povo brasileiro de forma geral e, ainda, atrair mais investimentos ao setor, irá favorecer justamente esse aumento.
Nesse sentido, também vale citar o que o superintendente da Susep, Alessandro Octaviani, fala sobre: “A Lei é um dos tantos diplomas normativos que se insere nesse objetivo maior que é proporcionar o acesso e o consumo de seguro no nosso país”.
Quais as principais mudanças que a nova lei de seguro traz?
Antes de falarmos sobre as principais mudanças que a nova lei de seguro traz, temos de ressaltar um ponto importante: até então, no Brasil, todos os contratos de seguro eram regidos somente por dois textos legais: o Código Civil e o Decreto-Lei 73/66 (Lei do Seguro Privado).
Como o PL 2597/2024 virou a Lei 15.040/24, esta nova regulamentação substitui essas duas legislações, unificando tudo em um só regulamento e, claro, atualizando a legislação que se usava. Nesse sentido, as principais alterações que o Marco Legal dos Seguros traz são:
Revogações com a nova lei de seguro
Entre as mudanças que a nova lei de seguro traz estão as revogações. São elas:
- Código Civil:
- Artigo 206;
- Artigos 757 a 802.
- Decreto-Lei 73/1966:
- Artigos 9 a 14.
A nova lei de seguro deixa isso claro quando afirma em seu art. 133 que ficam “revogados o inciso II do § 1º do art. 206 e os arts. 757 a 802 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), bem como os arts. 9º a 14 do Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966”.
Mudanças com a nova lei de seguro
Em relação às mudanças, montamos uma tabela com as principais trazidas pela nova lei de seguro, bem como alguns dos aspectos que permanecerão iguais. Veja:
Tipo de mudança | Como fica? |
Interpretação de documentos | Em caso de ambiguidades nos documentos que as seguradoras fazem (instrumentos contratuais ou pré-contratuais, por exemplo), a nova lei de seguro traz que a interpretação deverá ser “mais favorável ao segurado, ao beneficiário ou ao terceiro prejudicado” (art. 57). |
Aviso de sinistro | O segurado tem de, prontamente, avisar a seguradora quando um sinistro acontecer, descrevendo causas e consequências. Ele também deve “seguir suas instruções para a contenção ou o salvamento”. |
Proposta de seguro | O prazo para a seguradora recusar uma proposta de seguro será, conforme o art. 49 da nova lei de seguro, de 25 dias (e não mais de 15, como era até então). Ainda, se recusar, ela tem de justificar a negativa ao proponente. |
Ações de seguro | A nova Lei 15.040/24 aborda em seu art. 131 que o foro competente para ações de seguro é o “do domicílio do segurado ou do beneficiário”, a não ser que se ajuíze “a ação optando por qualquer domicílio da seguradora ou de agente dela”. |
Cancelamento | Se o segurado não pagar a 1ª parcela do prêmio ou a prestação única, o contrato de seguro é automaticamente cancelado, “salvo convenção, uso ou costume em contrário”. |
Suspensão da garantia | Em caso de atraso nas demais parcelas, isso “suspenderá a garantia contratual, sem prejuízo do crédito da seguradora ao prêmio” após o segurado ser notificado. Ele terá 15 dias para resolver esse atraso. |
Resseguro | A resseguradora terá de pagar diretamente ao segurado caso a seguradora estiver insolvente. E mais: os valores de resseguro adiantados à seguradora devem ser usados imediatamente “para o adiantamento ou o pagamento da indenização ou do capital ao segurado, ao beneficiário ou ao terceiro prejudicado”. |
Mudança de risco | Se o risco inicialmente calculado aumentar e o prêmio reajustado superar 10%, “o segurado pode recusar o aumento” e pedir a dissolução do contrato em até 15 dias (art. 15). E se um sinistro ocorrer nesse período? A nova lei de seguro diz que a seguradora só pode negar a indenização se provar que o agravamento do risco causou o sinistro. |
Beneficiário | A nova Lei 15.040/24 também aborda que “é livre a indicação do beneficiário nos seguros sobre a vida e a integridade física” e que isso pode ser alterado “por ato entre vivos ou por declaração de última vontade”. A seguradora, porém, não responde por erro (pagar ao antigo beneficiário, por exemplo) se não for comunicada a tempo. |
Sem beneficiário identificado | Se, em 3 anos, a seguradora não identificar nenhum beneficiário ou dependente, o valor da indenização será destinado ao Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil — Funcap. |
Capital segurado e contratação | Quando se trata do seguro de vida e a integridade física, o proponente pode definir livremente o capital segurado e, ainda, “contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, com a mesma ou com diversas seguradoras”. |
Prazo de carência | Nos seguros de vida, “para o caso de morte” e “para o caso de invalidez por doença”, é permitido ter um período de carência no início, durante o qual a seguradora não paga se ocorrer o evento coberto. Porém, e se for uma renovação ou substituição de um seguro que já existia? Nesse caso, não pode haver período de carência, “ainda que seja outra a seguradora”. |
Exclusão por doenças preexistentes | Permitida só se não tiver carência e se o segurado omitir voluntariamente a existência da doença após ter sido questionado (parágrafo único do art. 119). |
Carência e doenças preexistentes | Conforme a nova lei de seguro, se o seguro de vida tiver carência, a seguradora não pode negar pagamento alegando doença preexistente (§ 4º do art. 118). |
Suicídio dentro de 2 anos | Essa exclusão do seguro continua valendo com a Lei 15.040,24, porém, se a pessoa cometer suicídio por estar sob “grave ameaça ou para defender outra pessoa”, a seguradora não pode usar o período de carência como motivo para não pagar a cobertura. |
Morte/incapacidade por atividades específicas | A seguradora deve pagar o valor do seguro — mesmo que o contrato diga o contrário — se a morte ou incapacidade ocorrer por conta de “trabalho, da prestação de serviços militares, de atos humanitários, da utilização de meio de transporte arriscado ou da prática desportiva”. |
Renovação automática | Após 10 anos de renovações automáticas de “seguros individuais sobre a vida e a integridade física”, a recusa da renovação exige notificação prévia de 90 dias e uma oferta de seguro similar e sem novas carências. Exceção: a seguradora pode recusar a renovação apenas se encerrar operações no ramo ou modalidade de seguro. |
Alterações em seguros coletivos | Mudanças contrárias aos interesses dos segurados exigem concordância de pelo menos ¾ do grupo (75%). |
Seguro coletivo | Limitação da atuação como estipulante no seguro coletivo para quem tem vínculo prévio e não securitário com o grupo beneficiado (caso contrário, o seguro será tratado como individual). Ainda, o documento de adesão deve ser preenchido pelos segurados ou beneficiários para que possam valer “as exceções e as defesas da seguradora em razão das declarações prestadas para a formação do contrato”. |
Seguros obrigatórios | Os seguros obrigatórios devem oferecer uma cobertura mínima “de modo a permitir o cumprimento de sua função social”. |
Prazo para manifestação sobre cobertura | 30 dias após receber documentos, sob pena de perder o direito de recusar. |
Prazos maiores para apuração de cobertura mais complexa | A nova lei de seguro trata que a Susep pode ampliar o prazo para até 120 dias em casos de maior complexidade. |
Solicitação de documentos complementares | O prazo de indenização só pode ser interrompido até 2 vezes para pedir documentos adicionais. Enquanto isso, no caso de seguros de veículos automotores, seguros de vida e, ainda, seguros cuja importância segurada seja de até 500 salários mínimos, o prazo só pode ser interrompido 1 vez. |
Manifestação sobre recusa no pagamento da indenização | Deve ser expressa, motivada e sem alteração do argumento após a recusa. A seguradora só pode alterar seu argumento se ficar sabendo de fatos que antes não tinha conhecimento. |
Prazo de prescrição | Conforme a nova lei de seguro, o prazo de prescrição continua de 1 ano para cobrança de prêmio, comissões de corretores e disputas entre seguradoras e resseguradoras. Para o segurado, o prazo de prescrição também é de 1 ano, mas aos beneficiários ou terceiros ele aumenta para 3 anos. |
Como você conseguiu perceber, a nova lei de seguro traz uma variedade de nuances. Essas são só algumas das principiais, por isso, para ficar por dentro de mais detalhes, recomendamos que confira a Lei 15.040/24 na íntegra.
Qual a impacto da nova lei de seguro?
Agora que o PL 2597/2024 virou a Lei 15.040, o mercado de seguros brasileiro terá de se adaptar, em até 1 ano, a todas as alterações que a nova lei de seguro traz, ajustando processos e práticas conforme o que está na nova legislação.
Explicando melhor, o que deve ser feito por conta do Marco Legal dos Seguros é:
- Atentar-se ao prazo para se adaptar;
- Treinar os funcionários, pois eles terão de se requalificar para conseguirem operar com seguros a partir das mudanças trazidas com o Lei dos Contratos de Seguro;
- Aprimorar os documentos para garantir conformidade com a lei, o que engloba desde as apólices de seguros até os procedimentos de subscrição.
Quais os desafios relacionados à nova lei de seguro?
Para tratar sobre os desafios relativos à nova lei de seguro, ressaltamos a fala do diretor de relações institucionais da CNseg, Esteves Colnago, quando ele diz que o equilíbrio que o PL já visava promover entre as partes envolvidas no setor de seguros “impõe novos desafios e, consequentemente, novas oportunidades de amadurecimento e crescimento do setor”.
Glauce Carvalhal, diretora jurídica da CNseg, também traz observações nesse sentido ao afirmar que o Marco Legal dos Seguros “acarretará desafios que demandarão estudo, análise, interpretação para sua correta aplicação, diálogo entre os diferentes atores sociais e profundo sentido de cooperação”.
Ou seja, com base nessas declarações, entende-se que será necessário um esforço conjunto para se alcançar os melhores resultados a partir da nova lei de seguro e, assim, conquistar objetivos como:
- Solvência e sustentabilidade do setor de seguros;
- Maior proteção ao consumidor;
- Mercado mais transparente e justo;
- Conformidade legal.
Nova lei de seguro: mudanças para um setor mais transparente
Como vimos, a nova lei de seguro atua em diferentes aspectos no que diz respeito ao seu propósito, que, somados, visam promover um equilíbrio entre todos os envolvidos no mercado de seguros, desde as seguradoras e resseguradoras até os corretores de seguro e consumidores.
Além disso, a Lei 15.040/24 também é benéfica por outros motivos, como os citados por Marcia Cicarelli, sócia da área de Seguros, Resseguros, Previdência Privada e Saúde Suplementar do Demarest Advogados:
“Ela [a nova regulamentação] é positiva por prever mais proteção aos segurados e consolidar em única norma diversos dispositivos que tratam do contrato de seguro”.
Portanto, essa nova lei busca reduzir desigualdades, aumentar a confiança nos contratos, tornar a procura por seguros maior e, ainda, expandir o mercado.
Ficou com alguma dúvida?